Como isto está, qualquer dia as pessoas começam a pedir autógrafos ao Camilo Lourenço e o Aimar não passará de alguém com um corte de cabelo parvo.
Acordo e atiro-me para o banho. Antes ligo o rádio e logo me inundam ondas cheias de pessimismo, lições sobre gestão financeira e possíveis conselhos para um suicídio em massa. Maço-me. Faço por esconder dos ouvidos as palavras dos especialistas na crise, deixo que a água corra sobre mim, inundo-me de optimismo. A vida, sem a frase montypythoniana, parece ser uma terrível construção de dias com destino traçado. Com ela, torna-se-me tudo suportável, até o peso do sono que se lava com gel de banho e duas ou três músicas cantadas a má voz, péssimo timbre e uma viagem de memórias que dura o tempo possível até a mão decidir fechar o banho numa torneira quente.
Puxo o elevador, e o som abafado do seu voo vertical traz-me e leva-me para a realidade. Sempre com o olhar, ressalve-se, de quem olha para o lado mais luminoso da vida. Para o lado bom.
Na rua, alguém lembra que o dia podia estar melhor. Rio-me. O rio que corre por dentro de mim não tem tempo para parar na margem das palavras inúteis e desesperadas. Sigo em frente pelo caminho mais longo das horas, enquanto dois cães se cheiram e não conhecem, nunca ouviram falar, numa tal de crise. É bom parar de vez em quando, fecharmo-nos no nosso próprio cinema, iluminar os dois cães com luz real, do sol, e ficarmos ali, espectadores das cenas que nunca chegaram a passar no filme. Este eu acho que o Ministério das Finanças não viu. Talvez tenha preferido um mais dramático.
No carro, empilham-se em frente, atrás, de lado, conjuntos de gente irritada, quase sempre sozinha, ouvindo as novas que o dia e as notícias trazem e têm para oferecer. Prefiro a velha cassete. Hoje vai o Camarón para o trabalho, amanhã o Hendrix, depois o Manu Chao e todos eles sem conhecerem o PIB nacional.
O Mundo anda tão preocupado com o que os outros têm para dizer que se esquece de se esquecer. Ontem, hoje, amanhã todos juntos num pacote noticioso que arma as pessoas para as conversas em corredores sem fumo e risadas entre twitters e messengers.
Amanhã levo um "Este dia está fabuloso" para as ruas. E espero que não me levem a mal.
2 comments:
A culpa, a culpa... A crise é "global", chega a "todos", mas temos mesmo de pactuar com a tristeza generalizada? Naaaaaaa... Atira-lhes com um "Este dia está fabuloso" e não peças desculpa.
(como sempre, belo texto)
Always look on the briiiigth siiide of live!
Gosto desse optimismo! Belíssimo texto.
Abraço
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