Thursday, February 21, 2008

Tenho a certeza absoluta da inocência de camacho. No entanto, isso não o impedirá de ter de responder, no Julgamento de Nuremberga, pelo holocausto futebolístico que dizimou, cruelmente, milhões de Benfiquistas.
Título do "Record":

"CAMACHO RENDE-SE AO PATRÃO - «Rui Costa é o melhor jogador do Benfica»"

Portanto, temos um patrão que aceita receber ordens do seu empregado. Se o Carvalho da Silva sabe desta, ainda se candidata a Presidente do Benfica. Para receber ordens, claro.
No desamor e na morte, dói tudo. Dói tanto, tanto, tanto que até as coisas que não temos doem. No meu caso, doem-me os ovários.

Saturday, February 09, 2008

Francisco do Carmo Silveirinha

Na sala, estão quatro homens. Deitados. Alguns ligados à vida por tubos que vêm de cima até às veias. Sempre o sangue. E a falta dele. Olho-os a medo, culpado de estar de pé, culpado de respirar aparentemente bem, aparentemente sem precisar de tubos ligados às veias ou máscaras a cobrir a cara. Ninguém parece importar-se, além de mim, com a minha condição de saúde, supostamente impecável. Além de mim. Culpo-me por estar de pé ou culpo o mundo por estarem os outros deitados? Não encontro resposta.
Ao canto, ao lado da janela que timidamente deixa entrar uma luz baça, encontro o homem que é meu. Mais do que os outros três, aquele é o meu homem. O meu lugar. Beijo o homem na testa, inundado de medo e de carinho. Nunca na vida tivera esta mistura explosiva dentro de mim: medo e carinho. A questão, nas próximas horas, será saber quem ganhará o duelo das emoções. Pretende-se que seja capaz de estancar as lágrimas, de esconder os mais secretos medos, para que o carinho de dentro de mim leve o homem a viajar, sem percalços ou hesitações. O homem olha-me, triste, quase indiferente. Sabe quem sou? Sabe que em manhãs e tardes e noites iguais às que agora vive, deitado numa cama, me teve nos braços, ancorando-me à vida, prendendo-me nos braços o meu coração pequeno? O tubo, gota a gota, respira, respiram os pulmões do homem, devagarinho, respira a luz, baça, para dentro do quarto, respiramos em uníssono, os quatro homens e eu, na certeza de uma luta pelo sangue. Pela vida. Num esboçar de dor, o homem vem pedir-me, olhando-me, que o levante. Levanto-o. O seu corpo que treme, magro, exige-lhe uma força que ele não tem; seguro-o por debaixo dos braços e iço-o como uma grua iça um telhado de uma casa. Ele abraça-me. Não por carinho, mas pela necessidade que o seu corpo tem de uma âncora. Sou eu agora o ancorador. O porto seguro daquele corpo, daquele homem, daquela vida, daquele sangue que luta, contra todas as previsões, por uma réstia de esperança. Por um resto de luz. Por mais um pequeno nada. Levo o homem devagar, apalpo-lhe o peito, as costelas, as ancas, osso e tecido e, talvez, uma gordura que eu já não sinto, mas que existe, e ainda o faz poder mover-se. Antes de sair do quarto, com o homem ancorado a mim, revejo o quarto e os três homens deitados: é isto a vida, penso. É isto a morte. No corredor, duas ou três enfermeiras, muito brancas, tratam o homem como uma criança. Brincam com ele, provocam-no, à espera de uma reacção. Não há, ou quase não há. Há um olhar que se perde, muito mas muito além dos limites daquele andar, daquelas paredes, do chão, das portas, das janelas, do mundo. É um olhar para dentro. Quando o homem olha as enfermeiras, quando o homem me olha, ele não nos olha, ele olha-se; olha a luz que parece esvair-se dentro dele, mas procura ainda no escuro, ou quase escuro, um último refúgio. Levo o homem pelo corredor, digo-lhe banalidades, mentiras, esperanças, digo-lhe e digo-me, digo-nos, pequenas verdades estilhaçadas que não chegam para que o homem me reconheça. Ele só reconhece o lugar onde está. O quarto escuro em que o seu sangue se move. Ancorado a mim vai, pé ante pé, levado pela inércia da sofreguidão humana, em direcção a uma janela. Dessa janela, só a noite entra. A noite e luzes. Umas mexendo-se, por caminhos e estradas, outras estanques, como se estivessem a velar a noite. Como se nos velassem naquela noite. Chegados à janela, abro-a para sentirmos o vento e uma chuva miudinha que vem molhar-nos as pontas dos narizes. Penteio o homem, passo-lhe gotas de chuvas pela cabeça e pelo cabelo ralo. Encosto o seu corpo fraco junto ao meu, para sobrevivermos. Sobreviveremos? Sem saber a resposta, é o corpo do homem que me responde: levantando os dois braços sobre os meus ombros, o homem abraça-me. E parece que aquele abraço é o fim e o princípio de tudo. Naquele abraço, estão dias, meses, anos abraçados. Anos abraçando meses. Meses abraçando dias. Dias abraçando horas. Horas abraçando uma luz. Choro. De medo, mas mais do que tudo, de carinho.

Sunday, February 03, 2008

Ão Ão

Há quem diga que o Homem nunca esteve na Lua. Não vejo o que isso possa importar. Se nós, admiradores sagrados da transcendência, mesmo que em solo terrestre, nos satisfazemos com a precariedade solene das coisas pequenas, se nos engrandecemos com a mais simples promessa de mar para quê olharmos para o cimo do cimo? Para o alto que está além da distância que vemos? O céu, espécie de manto transparente de todas as coisas, chega-nos.
Há quem diga que o Homem nunca esteve em Terra. Que tudo não passa de uma ilusão mental colectiva, um sonho absurdo e louco de um cão que, entre refeições, decidiu estender as pernas, estender o corpo, estender o cérebro muito além do que o planeta em que vivia imaginava. E imaginou casas, coisas, árvores, gente, pedaços de terra, água, estradas sinuosas, animais, fontes, prazeres, divindades, igrejas, cruzes, sonhos, fadas, ideias, legendas, pensamentos, traduções, conversas, dunas, atalhos, vidros, esmolas, fronteiras, países, ondas, marés, paixões. Não vejo o que isso possa importar. Se respiramos, se representamos na loucura sórdida de um cérebro de um cão, então somos. Sem ponto e vírgula, sem reticências, sem exclamações ou interrogações, então, até sem ponto final somos, imagine-
se