Saturday, July 22, 2006



Acordei atordoado com o conteúdo do sonho que tivera, mas, simultaneamente, com uma plenitude própria de ter recebido uma mensagem que me era destinada.
Se o atordoamento tem justificação (quantos vezes acordamos de um sonho petrificados com o final do mesmo?), já a ideia de os sonhos serem constantes mensagens que o cérebro nos envia com a intenção de nos poupar sofrimentos (neste caso?), ou outro tipo de mensagens, deixou-me primeiro em êxtase, seguindo-se, rapidíssima, a total estupefacção.
Resumindo: acordei e tive duas sensações: estava atordoado pelo conteúdo do sonho e resignado pela forma como chegou até à minha consciência.
O irónico é que, acabado o período autista que surge quando abrimos os olhos, os papéis mudaram de lado.
Do atordoamento provocado pela mensagem propriamente dita, passei a uma compreensão e aceitação do conteúdo; por outro lado, a sensação de plenitude por saber o meu cérebro a funcionar correctamente, deu lugar à indignação e incompreensão.
Como pode o cérebro, animal vicioso e depravado, enviar mensagens directamente para os nossos sonhos, sem aviso prévio? E serão fiáveis essas mensagens? O que é que o cérebro sabe, que eu não sei? Tudo isto é perturbante…
Tendo em conta que o cérebro (entidade divina do corpo) faz parte de mim, e que sou constantemente surpreendido através dos sonhos, o que se pode (e deve) concluir é que eu não sei tudo sobre mim. Conclusão óbvia, dirão alguns. Não tão óbvia assim. Vejamos:
Qual será a credibilidade de um cérebro para pôr e dispor de nós, conforme entende? Achará o dito que nós não o conhecemos já de ginjeira? Aqueles sonhos todos trocados, aquilo é coisa que se apresente por parte de Sua Excelência, toda-a-poderosa Massa Cinzenta?
Não me deixo enganar. Aquelas vacas amarelas em cima da televisão, os amigos com corpos de cobra, os jardins da minha cidade inundados pelas ondas do mar em noites húmidas, a ex-namorada a dar-me beijos… Vou confiar neste tipo?
Não. Não, não e não. O exercício que vai revirar as entranhas já está no prelo: antes de adormecer, pensar em coisas totalmente normais: namorados no jardim aos beijos; vacas a pastar; uma mulher, em casa, a mudar canais; alguém que diz a outro: “Amo-te”.
Coisas comezinhas. O quotidiano. Nem mais nem menos. Quero ver se o gajo continua a mandar atrozes mensagens, enquanto descanso…
Esta foi a última vez que acordei a meio da noite para escrever sobre o cérebro. Acabou-se. Preciso de dormir, o corpo está cansado, não quero saber de mim mais do que aquilo que sei, não quero medos nem imaginações, não quero coisas impossíveis.

Ela levantava-se da mesa, olhava-me enquanto ajeitava o cabelo dos olhos, sorria (juro que o Sol lhe dourava a face) e dava-me um beijo.

Cabrão do cérebro. Não basta já a realidade?

1 comment:

Tudo de mim. Ou quase. said...

Os sonhos são o prolongamento inconsciente da consciênca. Não passam, muitas vezes, de desejos calados que não assumimos ou atrevemos a pensar conscientemente, quanto mais dizê-los em voz alta. Sim. Não. Talvez. Eu sei lá...
Da minha parte também não me responsabilizo.