Wednesday, July 19, 2006

O Poeta é um ser transcendental?



Casa - "Surpresa. Após tanto deste amor, supunha tê-lo espalhado pelo mundo."

- Giuseppe Ungaretti

Questão: Se "o poeta acaba sempre por encontrar as palavras que nos encaixam", como diz a azuki, o que faz com que esse mesmo poeta tenha essa capacidade? Nasce o trabalho do poeta através do seu especial talento ou, antes, de muito trabalho? Ou das duas? É da transpiração que vem a obra-prima ou da inalcançável transcendência?



4 comments:

marta cs said...

Sem poder desenvolver muito (trabalho aos molhos), na minha opinião, é uma questão de sensibilidade. E de outras coisas, claro.

E lembrei-me de uns versos do José Gomes Ferreira (o incontornável...):

Nós, os poetas viris,
que trazemos nos olhos
as lágrimas dos outros.


Presunção? Não acho.

Baci :)

Ricardo said...

Claro, sensibilidade. Obviamente. Mas deixar correr no papel o líquido que nasce da sensibilidade é para todos? A resposta é negativa, pois claro. Então, em que ficamos? Na minha opinião, o poeta é poeta por não ser outra coisa. Parece romântico (e é), mas só assim eu concebo alguém poeta. Uma pessoa que não pode deixar de o ser. Por essas lágrimas que correm, mesmo as dos outros. O trabalho não é desprezável mas tem de haver mais... não acredito que alguém que, hipoteticamente, se dedicasse a fazer poemas durante 30 anos, dez horas por dia, conseguisse pérolas iguais a certos poetas. Eu dou a primazia ao talento...

marta cs said...

Não é para todos. Parece e é romântico e eu às vezes detesto ser romÂntica, mas eu confesso: eu acho que sim, que o poeta é transcendental. Ou seja, não é para qualquer um. Não, senhor! Voto no talento. Mas também é preciso trabalho, para acertar com vírgulas e ortografia e mais não sei o quê! eheheh :)

azuki said...

Não me parece que poeta que não tenha uma ponta de génio e uma enorme sensibilidade consiga ser mais do que medíocre. Acresce que há pessoas suficientemente afortunadas a ponto de serem bem mais inspiração do que transpiração. No entanto, não creio que a produção sistemática de qualidade possa prescindir do rigor, da exigência, da dedicação.

Lembro-me agora de um poeta cuja escrita é tão límpida, que quase parece fácil: os seus poemas não têm, nem necessitam, de artifícios, porque Eugénio de Andrade tinha a obsessão das palavras certas. Contudo, essa simplicidade (também) era sinónimo de tempo e disciplina: “Sou capaz de passar oito horas à roda de um poema e no dia seguinte deitá-lo ao lixo. Sou capaz de não dormir por causa de um verso”.