Tuesday, July 18, 2006

Não, não é uma pintura antiga, é o Brad Pitt fazendo de Aquiles. E depois?


De um blogue não engravatado (Leitura Partilhada), um texto interessante, um dia depois de ter visto pela primeira vez o filme "Troy" e, mais uma vez contra preconceitos, ter gostado bastante do filme, ao ponto de achar que está bastante bem conseguida a (sempre) difícil tarefa de passar um livro destes para cinema:

INTIMAMENTE ESTAMOS TODOS DO LADO DOS TROIANOS Homero é inquestionavelmente um grande poeta, isso não se pode negar. Mas, devo cair aqui em uma heresia: para mim, a Odisséia é muito superior à Ilíada. A Ilíada tem algo de ignóbil, o tema de cantar a ira de um homem. Podemos salvar Homero supondo que se preferimos Heitor é porque ele também preferia Heitor. Creio que visto assim… por que todo mundo sente simpatia por Tróia e por Heitor e ninguém sente simpatia pelos gregos? É porque são melhor mostrados os troianos. Podemos supor que Homero, mesmo sendo grego, estava intimamente de lado dos troianos. Se todo mundo leu a Ilíada do ponto de vista de Tróia é porque o autor também a escreveu do ponto de vista de Tróia. Não creio que se equivocasse. Todos queriam descender dos troianos e ninguém quis descender de Aquiles. Posso lhe dar um dado bastante curioso: estava lendo a História dos reis da Noruega, de Snorri Sturluson, e há uma referência a Thor, o deus do trovão, e este homem escreve no século XIII, na Islândia, e diz que Thor era, sem dúvida alguma, proveniente de Héc-Thor. Todos queriam ser troianos, mesmo esse homem, ali no distante norte, queria que seus deuses fossem troianos. E depois, sempre que se fala de Odin se diz que veio de Tróia. Todos sentiam atração por Tróia. Não lhes ocorria dizer que eram parentes de Aquiles ou de Agamenon.

Jorge Luis Borges

11 comments:

marta cs said...

Bem, depois do choque voltarei aqui para ler o texto. A imagem deixou-me em transe e pus logo uma gravata ao pescoço, para não me sentir obrigada a voltar à realidade... Eh eh eh!

I'll be back!!!

(tira essa imagem daí se queres que as pessoas leiam o texto!!!)

Ricardo said...

eh eh...
é um teste: quem conseguir passar o primeiro "choque" e ler o texto ganha um rebuçado. Tu, pelos vistos, já chumbaste LOL :)

marta cs said...

Mas completamente! Acabei agora de ler o texto, é difícil concentrar-me! eheheheheheh

Tenho de ver o Tróia... Mais um para alugar!

Ricardo said...

Gostei muito. O filme segue bastante bem o conteúdo do livro. E aquela coisa de a Helena ter sido a razão primordial do ataque por parte dos gregos a Tróia continua a não fazer sentido. O Rei de Esparta, ganancioso, queria o poder. Recuperar a cunhada (Helena, mulher de Menelau) foi apenas a face mais fácil e visível de uma vontade muito mais forte: a vontade do poder. Mais uma vez, e isto acontece recorrentemente entre homens, a mulher serviu de desculpa. Os homens querem é poder, pá! Se puderem dizer que é por uma mulher, tanto melhor. E que bela era Helena...

marta cs said...

Li a Odisseia, mas não li a Ilíada. E também não vi o Tróia. Que falha...

Bom, mas concordo contigo. Sempre as mulheres como perdição, sempre a mesma desculpa que legitima tudo! Também acho: poder, poder, poder.

Já passaram uns quantos séculos e está tudo parecido, olha que chatice.

Ricardo said...

Já tive oportunidade de discutir isso no Leitura Partilhada (já agora...um blogue muito bom, caso não o frequentes).
Eu acho que mudou. Mudou para pior. A nobreza de carácter demonstrada pelos homens dessa altura (como cabeças de cartazes, obviamente Ulisses, Aquiles e Heitor) não tem paralelo. Hoje em dia, somos todos muito pouco éticos, muito pouco «honrados». A questão da «honra» fascina-me. Morrer por um país, por uma mulher, por uma ideia. Dramático, talvez, mas poético e - por que não? - real.

marta cs said...

Vou ao Leitura Partilhada de vez em quando e gosto!

Também tenho esse fascínio e a maior parte das vezes até fico convencida de que era capaz de morrer/ser presa/deportada/whatever por uma ideia oucausa. Por um homem, assim desse ponto de vista romântico, não sei... Sinceramente, se calhar, há uns anos atrás, dir-te-ia que sim, agora digo-te que é pouco provável.

Mas fascina-me. A sério que sim. E acho que me entregava mesmo por uma ideia ou causa. Tinha era de acreditar nela piamente.

Ricardo said...

É compreensível que em termos amorosos, não estejas minimamente inspirada e importada em morrer por quem quer que seja. Isso é justo. Aliás, nem sei para que é que dei o exemplo de "morrer por uma mulher", é aquela alga lamechas que se cola e arranha. Acima de tudo, o que estava em causa era morrer por uma ideia. Pronto, aí estamos de acordo. Deixemo-nos ficar por aqui. Sem mortes de índole amoroso...

marta cs said...

É melhor... Até porque os outros devem ir morrer bem longe! Eles. E não nós. :) boa, percebeste a ideia sem ter de a explicar tintim por tintim!

Ricardo said...

Errata:

"amorosA"

Ah os outros ainda cá andam? Julguei-os naúfragos numa ilha longe, muuuuuuuuito longe.

Conheces Giuseppe Ungaretti, o poeta italiano?
Tem uma frase que é uma das minhas preferidas desde muito novo, desde tempos em que a frase não significava o que significa hoje, uma frase formidável. E é esta:

"Após tanto deste amor, supunha tê-lo espalhado pelo mundo"

Cá está a prova de que, em poesia, não é preciso usar muitas palavras para dizer tudo...

azuki said...

o poeta acaba sempre por encontrar as palavras que nos encaixam

acho que é por isso que leio